A extrema-direita ameaça nossas maiores conquistas

Por Adelson Vidal Alves 

"Penso que o desenvolvimento da história europeia atingiu sua última fase com a democracia liberal. Não se pode ir mais longe. Podemos somente melhorá-la: a liberdade pode ainda ser explorada e desenvolvida em muitas direções", disse a filósofa húngara Ágnes Heller, que era discípula do pensador marxista  György Lukács. Heller vai além ao afirmar que "Nossa única chance de sobreviver é preservar a democracia liberal".

As democracias liberais se caracterizam, basicamente, pela existência de eleições permanentes, mecanismos de controle do poder, pluripartidarismo, liberdade individual, de crença e expressão. Tais elementos se reúnem de forma distinta, dependendo do país. Brasil e EUA são democracias liberais, porém com modelos distintos. 

O que faz uma democracia liberal se desfazer? Olhem para a Hungria de Orban, a Venezuela de Maduro e a Rússia de Putin. Tais nações conservam eleições, mas as liberdades já foram sufocadas. É o que se chama hoje de "regimes iliberais", ainda que pessoalmente considere Rússia e Venezuela ditaduras abertas já há algum tempo. 

Fukuyama foi otimista demais quando imaginou que a vitória das democracias liberais encerravam a história, mas Heller recupera o discurso certo para os nossos tempos, sem triunfalismos. A história não acabou e as democracias liberais tem inimigos poderosos. Se não fizermos nada, nenhum demiurgo nos salvará de um futuro tenebroso. É preciso lutar e defender a democracia liberal contra os fundamentalistas, os relativistas, os terroristas e, principalmente, o nacionalismo da extrema-direita. 

Nas eleições recentes da União Europeia vimos um avanço da extrema-direita. O presidente da França, Emmanuel Macron, dissolveu o parlamento francês por conta de sua derrota para a extrema-direita nas eleições europeias. Países como Alemanha e Áustria são exemplos do avanço desta direita. A boa notícia é que os rumos da Europa ainda estão nas mãos dos partidos históricos e defensores da unidade europeia. Mas alguns sentimentos retrógradas crescem na população, sobretudo a anti-imigração. A extrema-direita também carrega o negacionismo climático e práticas de isolacionismo. 

O fato é que a extrema-direita cresce e ameaça a ordem internacional fundada em regras. Putin foi reeleito na Rússia, a China amplia o totalitarismo, Maduro segue no poder da Venezuela, a Argentina tem um extremista no poder e no Brasil o bolsonarismo segue vivo. Para piorar, Trump tem grandes chances de vencer na maior potência mundial.


Caso a democracia liberal seja derrotada, é possível que o novo não seja o que Heller desejou, ou seja, um aprofundamento das liberdades (como também é meu sonho, conforme escrevi no meu último artigo). Há ameaças reais que nossas liberdades percam o verniz universal, sendo tratadas como patrimônio de uma civilização decadente, a ocidental. Escolhas do indivíduo se submeteriam a padrões morais estabelecidos, penalizando minorias religiosas e sexuais. Os direitos humanos também seriam abolidos em nome de relativismos, a opinião e a imprensa seriam controladas. Seria o fim do mundo em que vivemos. 

Sei que muitos de nós não morrem de amor pela democracia liberal. Mas seria sensato apostar nossas maiores conquistas quando no horizonte as alternativas são perigosos retrocessos? Eis a questão que muitos dos beneficiados pelas liberdades democráticas devem refletir.

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