A ciência não está aqui para fazer a gente se sentir bem

Por Adelson Vidal Alves 

Em 1978, quando participava de uma conferência, o biólogo norte-americano Edward O. Wilson recebeu um jarro de água gelada na cabeça. Era um ato de protesto contra as opiniões de Wilson, que defendeu em um de seus livros que muitos comportamentos humanos tidos como reprováveis são na verdade apenas reprodução das determinações genéticas. Os manifestantes e a esquerda em geral se recusam a aceitar que suas utopias igualitárias podem não caber em nossos genes. 

Criador da sociobiologia, Edward enxergava o egoísmo como aspecto definitivo dos nossos traços genéticos. Para ele, nem mesmo nossas práticas de altruísmo seriam capaz de testemunhar a favor de alguma benevolência natural humana, pois "o altruista espera reciprocidade da sociedade". 

Outro biólogo renomado que se aproximou das teses de Wilson foi Richard Dawkins, que quando não fala de Deus é sempre brilhante. Em seu livro clássico "O gene egoísta" escreveu: "O argumento deste livro é que nós, e todos os outros animais, somos máquinas criadas pelos nossos genes (...) Sustentarei a ideia de que uma qualidade predominante que se pode esperar de um gene bem sucedido é o egoísmo implacavel". Assim como Wilson, Dawkins foi acusado de determinismo biológico.

O pensamento segundo o qual nossa natureza não é generosa não se resumiu às ciências da natureza. Napoleon Chagnon, polêmico antropólogo, pesquisou membros da tribo Ianomâmi e chegou a conclusão de que suas guerras não eram apenas por terra, como defende o consenso progressista antropológico. Chagnon descobriu que os ianomâmis brigavam por sexo. Ou seja, ficava evidente que os nossos genes brigam por sua sobrevivência e extensão. 

Compreendo que concluir que coisas abomináveis da nossa espécie são fruto da nossa genética é algo perturbador. Psicopatas, alguém pode dizer, não são criminosos, apenas prisioneiros da sua biologia. Caso um dia a genética comportamental conclua assim, teríamos que repensar nossos sistema penal. Mas e se somos mesmo seres condenados a reproduzir comportamentos  horrendos como guerra, violência e o puro egoísmo?  Caberia a ciência nos relatar ou proteger a ideia do livre arbítrio em favor da responsabilidade individual?

James Watson, prêmio Nobel de medicina e um dos descobridores da estrutura do DNA, anda a falar asneiras racistas, como a de que negros são intelectualmente inferiores aos brancos. Porém, em sua defesa, ele nos lembrou bem sobre o verdadeiro papel da ciência. Escreveu ele: "A idéia de que algumas pessoas são más por natureza me perturba. Mas a ciência não está aqui para fazer a gente se sentir bem". 

De fato, a ciência não está aqui para atestar nossas utopias morais. Ela deve sempre falar a verdade, doa a quem doer.

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