O Brasil irá se tornar uma Genebra calvinista?


Por Adelson Vidal Alves 

A ex-primeira dama, Michelle Bolsonaro, usou a Avenida Paulista como palco religioso, no último dia 25, quando apoiadores de seu marido se manifestavam. Disse Michelle: "Por um bom tempo fomos negligentes ao ponto de falarmos que não poderia misturar política com religião, e o mal ocupou o espaço. Chegou o momento da libertação. Eu creio em um Deus todo poderoso capaz de restaurar e curar nossa nação". A senhora Bolsonaro, ainda, prometeu que o Brasil seria de Jesus, numa demonstração clara de pouco apreço pelo Estado laico. 

No século XVI, em Genebra, vigorou um governo que demonstrou o que acontece quando religião e política se misturam. João Calvino, um dos principais nomes da Reforma protestante, obrigava toda população a dedicar suas vidas ao trabalho e a oração. A vestimenta era controlada, bebidas alcoólicas foram proibidas, assim como teatros e jogos de azar. Os que optassem pela desobediência poderiam pagar com a vida, como aconteceu com o teólogo Miguel Servet, condenado à fogueira.  Ele foi queimado vivo, logo depois de ter lhe sido negado uma morte menos brutal, a de decapitação. 

A Genebra calvinista se repete nos tempos modernos. No Irã islâmico, comportamentos tratados como imorais podem render a perda da vida. As teocracias muçulmanas se igualam à brutalidade tirânica expressa no governo de Calvino. Assim como nos tempos medievais, onde o fogo consumiu hereges, toda política quando ganha caráter fanaticamente sagrado gera barbárie. 

O Brasil com o qual sonha Michele e os adeptos da Teologia da dominação, segundo o qual o Reino de Deus se mistura ao poder mundano, só poderia ser um país aos moldes teocráticos, com prevalência absoluta da moral puritana.

O teólogo Ricardo Gondim expressou bem como seria o Brasil dos evangélicos:

"Caso acontecesse, como os novos puritanos tratariam Ney Matogrosso, Caetano Veloso, Maria Gadu? Respondo: seriam execrados como diabólicos, devassos e pervertedores dos bons costumes. Não gosto nem de pensar no destino de poesias sensuais como “Carinhoso” do Pixinguinha ou “Tatuagem” do Chico. Um Brasil evangélico empobreceria, já que sobrariam as péssimas poesias do cancioneiro gospel. As rádios tocariam sem parar músicas horrorosas como  “Vou buscar o que é meu”, “Rompendo em Fé”.

E segue: " Um Brasil evangélico não teria folclore. Acabaria o Bumba-meu-boi, o Frevo, o Vatapá. As churrascarias não seriam barulhentas. A alegria do futebol morreria; alguma lei proibiria ir ao estádio ou ligar televisão no domingo".

O Brasil de Michele e do fundamentalismo evangélico seria mais ou menos assim. Será que um dia veremos a Genebra calvinista virar realidade no Brasil?

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