Em matéria de política externa, os neoconservadores tem muita razão


Por Adelson Vidal Alves 

Segundo Francis Fukuyama, falando de forma resumida, o neoconservadorismo se resume em quatro pontos: 1) É importante avaliar o caráter interno de um regime político 2) Os EUA têm o dever de serem intervencionistas 3) Desconfiança com projetos de engenharia social 4) Ceticismo quanto à eficácia das leis e das instituições internacionais. 

Os neoconservadores tiveram influência em pelo menos dois governos republicanos: Reagan e Bush. O primeiro era um neocon (como também são conhecidos os neoconservadores) convicto, o segundo nem tanto. A interferência das ideias neoconservadoras nestas administrações é visível, sobretudo na invasão americana ao Iraque. Para os neocons, não se tratava de uma ação de puro interesse americano, mas um ato de benefício global. 

A ideia é que intervenções americanas possam impor regimes democráticos em regiões onde prevalece o eixo maligno da autocracia e do terror. Tal ideia, claro, agrada a direita republicana, e tem apelo nos setores americanófilos do mundo todo. A esquerda, em sua maioria, tem pavor. Não suportam que a soberania nacional seja ferida por ambições universalistas. O relativismo esquerdista insiste que a democracia ocidental é coisa de uma civilização, uma cultura, não valor universal. 

Já escrevi algumas vezes o quanto é utópico e ingênuo imaginar que o desenvolvimento global se dará de forma espontânea e pelo esforço exclusivo de cada nação. Ainda se faz necessário que potências estrangeiras de sucesso e de inequívoca vocação democrática coopere com inteiras regiões do planeta, até mesmo usando a força. Só pacifistas tolos acreditam que a paz é possível apenas com persuasão. As guerras às vezes são necessárias como forma de defender direitos humanos e a estabilidade planetária. 

A interferência militar da OTAN em Kosovo, por exemplo, visava impedir o genocídio dos albaneses. A aliança militar do Ocidente precisou agir contra a autorização do Conselho de Segurança da ONU. Os neocons estão certos, algumas organizações internacionais podem ser nocivas ao processo de paz. 

Robert Kagan é um dos principais nomes do neoconservadorismo. Em seu livro "Do paraíso e do poder" ele acusa a Europa de se acomodar nas suas responsabilidades militares, confiando no guarda-chuva americano. Os europeus estariam se preocupando com bem estar social, cooperações diplomáticas, enquanto só os EUA pensam na segurança internacional. Não está todo errado Donald Trump quando cobra a cota europeia no financiamento da OTAN (Me permita um adendo: sua fala de que permitirá e até vai incentivar, como presidente, a Rússia invadir "países inadimplentes" é um absurdo sem precedentes). De fato, é preciso pensar em mais investimento europeu com defesa. O mundo lindo da paz perpétua kantiana está longe de existir. 

O mundo passa por um profundo conflito de civilizações. A Rússia é a ameaça imperial em pessoa. Putin mandou às favas as leis internacionais quando invadiu a Ucrânia em fevereiro de 2022. Só não vai mais adiante porque as armas da OTAN o impedem. Não é o Conselho de Segurança das Nações Unidas que detém Putin, mas sim as armas nucleares do Ocidente. 

Sou um defensor da Ordem Global fundada em organismos multilaterais, capazes de estabelecer consensos pacíficos nas relações inter-estatais. Mas é preciso um ambiente internacional mais maduro para que baixemos definitivamente as armas. O novo mundo que surgirá depende do resultado dos conflitos em Gaza e na Ucrânia. Putin não atende resoluções internacionais, e em Gaza um braço da ONU acolhe literalmente terroristas do Hamas em seu meio. Dá pra confiar na ONU?

Comungo da tese neoconservadora de que é necessária uma "hegemonia benevolente" americana. A intervenção dos EUA em vários conflitos do planeta, e até mesmo com uso de guerras preventivas, traz muito mais benefício do que prejuízo para o mundo. Claro que os EUA cometeram e vão cometer excessos e até atrocidades. Mas nada se iguala ao que seria caso uma nova ordem global entregasse poder para o eixo maligno autocrático/terrorista. Se Rússia e China vencerem a nova Guerra fria, sentiremos falta da Pax americana. Em muitos aspectos os neocons estavam certos.

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