Livros podem ser proibidos?


Por Adelson Vidal Alves 

O governo de Santa Catarina, comandado pelo bolsonarista Jorginho Mello (PL), ordenou a retirada de 9 livros das escolas públicas do estado. Entre as obras censuradas está o clássico da literatura distópica "Laranja mecânica" de Anthony Burgess. A secretaria de educação fez circular ofício onde não se lia a justificativa para a proibição. Mas cabe perguntar: há justificativa para se proibir a circulação de algum livro?

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro confirmou no ano passado a decisão de proibir comercialização do livro "Minha Luta", do líder nazista Adolf Hitler. A decisão ratificou uma liminar obtida pela Federação Israelita do Estado do Rio de Janeiro (FIERJ).  Em 1991, a Editora Revisão  do gaúcho Siegfried Ellwanger Castan, foi alvo de busca e apreensão de alguns de seus livros acusados de difundir pensamento racista. Castan e muitas das publicações de sua editora negam o holocausto e a morte de 6 milhões de judeus durante a segunda guerra mundial. Considero a primeira medida um erro, a segunda, não. 

Tanto na primeira decisão quanto na segunda, as obras vetadas são marcadas por racismo e antissemitismo. No entanto, enquanto o livro de Hitler representa relevância histórica, as obras da Revisão são pura apologia racista. O texto de Hitler está debaixo de um contexto histórico, e deve ser lido e compreendido a partir de mediações especializadas, através de notas e textos de auxílio. Os livros da editora de Castan estão carregadas de informações falsas com o único objetivo de depreciar os judeus, pura propaganda racista e regacionista. 

O grande John Stuart Mill defendeu em seu livro "Sobre a liberdade" que os governos não podem intervir nas escolhas individuais por nenhum motivo. Mill entende que o Estado não pode privar os leitores de consumirem leitura ruim com a justificativa de proteger o povo de algo negativo. Muitos liberais radicalizam tais ideias a ponto de achar que a liberdade de expressão precisa ser absoluta, com o mercado selecionando naturalmente o que é bom e o que é ruim. Acredita-se, assim, que as boas ideias prevalecerão pela ação da auto-regulação do mercado.

Idéias ruins podem e devem circular livremente. Mas a livre expressão absoluta e irrestrita é um problema quando permite ofender grupos e indivíduos, ou até ameaçar a ordem e a segurança pública e privada. Ouvir Anitta é um direito de todos, distribuir panfletos defendendo a escravidão de negros é um crime. Eis o significado da livre expressão nas democracias liberais modernas. 






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