Racismo estrutural não existe, o que é ótimo


Por Adelson Vidal Alves 

Há racismo no Brasil? Ninguém com um mínimo de decência e bom senso responderia que não. O preconceito de cor deixa marcas na nossa vivência social, com particularidades, no entanto, que nos diferenciam, por exemplo, dos EUA, onde na sua história se fez presente um arcabouço jurídico oficial discriminatório, no qual o sangue apontava o lugar de cada um no direito à cidadania. Nossos vizinhos do Norte separaram literalmente bebedouros e assentos em transporte públicos para brancos e negros. Isso não aconteceu por aqui. 

Há quem diga que nosso racismo é pior, pois é velado. Melhor seria que o ódio fosse aberto e declarado. Dizem, ainda, que o racismo brasileiro não se dá na esfera voluntária dos indivíduos, mas através de operação estrutural determinante contra negros e a favor dos brancos. Chamam de racismo estrutural. Mas, afinal, o que é isso? Fui atrás do conceito. 

Parti direto para o livro do dito grande teórico desta visão, o Ministro dos direitos humanos Silvio de Almeida. Ele tem um livro chamado "Racismo estrutural". Deve estar ali a conceituação desse negócio, pensei. Não estava. Passei páginas e páginas e nada. O máximo que encontrei próximo de uma conceituação teórica estão nessas palavras: "(...) em suma, o que queremos explicitar é que o racismo é a manifestação normal de uma sociedade e não um fenômeno patológico ou que expressa algum tipo de anormalidade". Almeida tem a ideia de que o racismo não é uma perversidade praticada por grupos e indivíduos, mas algo entranhado e determinado na vida em sociedade. Ok. Mas quais são as estruturas que provocam essa onipotente determinação? Não encontrei nada. 

Meu fracasso nesta missão é compartilhado por muita gente, de todos os lados. As negras Geisiane Freitas e Patrícia Silva, autoras de "O que não te contaram sobre o movimento antirracista" também não encontraram teoria decente no livro de Silvio de Almeida. As escritoras, doutoras e mestres, escrevem "o que ocorre, no entanto, pelo menos no livro Racismo estrutural, é a apresentação de uma teoria imprecisa". Elas, então, sem saber onde encontrar as tais estruturas, elaboram uma hipótese sobre o livro de Almeida. Para as pesquisadoras, a tese viria do marxismo. Se assim for, o capitalismo ofereceria as estruturas do racismo. Este, então, só teria fim com a abolição do capital. 

Há quem diga que só brancos de direita questionam as estruturas do racismo. Geisiane e Patrícia são mulheres negras e não estão sozinhas. Veja Jessé Souza (o popstar das livrarias progressistas), ele escreveu sobre o livro de Almeida em "Como o racismo criou o Brasil": "O problema é que nem nessa passagem nem nas outras partes do livro, em que fala dos efeitos políticos ou históricos do "racismo estrutural", o autor vai além da mera declaração de princípios". 

Muniz Sodré, outro nome respeitado nos meios acadêmicos da esquerda, também questionou o racismo estrutural. Disse ele: "Não há nenhuma estrutura que faz funcionar os mecanismos de discriminação. Sem dúvida alguma a palavra tem forte apelo político no ativismo afro, mas o "estrutural" não explica a complexidade no "arraigado" no sentimento racista". 

Dar bases estruturais determinantes ao racismo é perigoso, pois pode justificar a falta de culpa individual. A rede de supermercados Carrefour usou do termo racismo estrutural para amenizar a ação covarde de seus funcionários que agrediram um negro. Com essa tese, basta alguém dizer: "Sou racista, mas não quero ser. São as estruturas que me obrigam a isso". O sociólogo canadense Mathieu Bock-Coté aponta perigos nessa ideia de apresentar o racismo não como um ato de responsabilidade individual, mas como fruto da determinação das estruturas de poder. Escreve ele: "Será que não corre o risco, assim, de cometer sérias injustiças, ao tornar os homens culpados de um crime inconsciente?". E segue ele: "A consequência dessa desindividualização da discriminação é límpida: a sociedade culpada". Ou seja, algo faz o racismo no lugar das pessoas. 

O antropólogo Antonio Risério foi duro em suas observações sobre o tema, e afirmou o seguinte: "A "tese” dessa malandragem jurídico-ideológica é a seguinte. O racismo não acontece em plano individual – vem de um sistema de poder, de uma estrutura social. Como preto é oprimido e não conta com a estrutura a seu favor, está simplesmente impossibilitado de ser racista".

Faz sentido. Com o racismo estrutural negro é possivel dar legitimidade para negros ofenderem brancos sem receber o rótulo de racista. O racismo no Brasil passa a ser coisa exclusivamente de brancos contra negros. Ora, racismo é racismo. Pode ser de brancos contra negros, negros contra brancos, negros contra judeus, árabes contra chineses etc.

Ao falar da Polícia, a instituição tratada como exemplo de racismo estrutural no Brasil, o sociólogo e autor de "Uma Gota de Sangue: história do pensamento racial", Demétrio Magnoli explica: 

"Segundo a tese do "racismo estrutural", os EUA (e o Brasil) estão atavicamente divididos pela fronteira da raça. A polícia, entre outros aparatos estatais, serviria para oprimir os negros, a fim de preservar os privilégios materiais e os interesses permanentes da maioria branca. (...) De acordo com sua lógica, a maioria nunca será persuadida a abrir mão da polícia racista. A única solução, portanto, seria uma revolução da minoria, algo obviamente impossível"

O conceito de racismo estrutural é fragil, mas ganhou ares de consenso. Parte-se da ideia que há uma misteriosa força onipotente empurrando Deus e o mundo para a prática do racismo, e ninguem questiona. Científicamente, racismo estrutural não existe, e isso é bom. O preconceito de raça permeia a mentalidade nacional como força hegemônica, com raízes culturais em nossa experiência escravocrata. Há, assim, estereótipos de cor que povoam a cultura brasileira e estimulam certos racismos, mas isso nada tem de determinante e estrutural. Pode ser vencido no campo das ideias, do contrário, nem valeria a pena pensar em uma educação antirracista. Afinal, se o racismo fosse estrutural, somente uma poderosa revolução poderia destruir essas estruturas e eliminá-lo. Felizmente, ele não é.

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