Marx, 205 anos


Por Adelson Vidal Alves



Na minha juventude fiz parte da ala esquerda da Igreja Católica, a chamada teologia da libertação. Com os evangelhos, a denúncia dos profetas, o Vaticano II e a Doutrina Social da Igreja, encontrei minha indignação ética com a pobreza e as grandes desigualdades que assolam o mundo. Pelos livros de Leonardo Boff, Frei Betto e principalmente com os ensinamentos do Cristo, entendi que não poderia ser cristão sem abraçar uma militância contra as injustiças sociais. Foi quando ingressei em movimentos sociais e mais tarde no Partido Comunista do Brasil. 

Mas além do meu ativismo eu precisava entender algumas coisas. Como em uma sociedade rica e produtiva tinha gente que ainda morria de fome? Foi ai que encontrei Marx. O filósofo alemão parecia ter construído uma teoria que explicava a miséria e a prosperidade convivendo juntas. Para Marx, são os patrões ambiciosos que exploram seus trabalhadores. Ficam ricos para que eles sejam pobres. Meu dever, então, só poderia ser um: lutar contra a burguesia por uma revolução proletária. 

Com o tempo perdi o interesse por esse Marx revolucionarista e romântico, que interpretou a história como uma locomotiva de direção única, de caminho inevitável até o triunfo da revolução socialista. O Marx do Manifesto, panfleto agitador que ele escreveu por encomenda com seu amigo Engels, me soou esquemático e utópico. Nada dele serve para quem quer pensar a complexidade do mundo contemporâneo. 

Mas há um outro Marx. Aquele que elaborou uma concepção materialista da história e da vida, que criticou o simplismo idealista de enxergar a consciência humana como sendo escolha plenamente livre dos indivíduos. Há estruturas a colaborar dialeticamente na formatação das mentalidades e até mesmo nas instituições. A obra marxiana dissertou sobre reificação, ideologia, alienação e foi capaz de prever a mundialização do capitalismo. 

O Estado não é mais propriedade de uma classe como pensava Marx, se é que foi um dia. No entanto, está claro que a máquina estatal está longe de ser absolutamente impermeável à força do domínio econômico. As ideias dominantes não são puramente resultado virtuoso da competição. Há influência clara de uma operação hegemônica no seio da sociedade civil. A ideologia predominante é fruto da batalha das ideias, como diriam os comunistas italianos. Uma disputa de ideias que se insere em uma produção desigual a partir de órgãos ideológicos inseridos na sociedade, os aparelhos privados de hegemonia, para usar o termo criado por um dos maiores intérpretes do pensador alemão, o italiano Antonio Gramsci. 

Karx Marx nasceu em 5 de maio de 1818, exatos 205 anos. Sua obra trouxe esperança a milhões de trabalhadores, ansiosos por uma nova ordem social. Também serviu como justificativa para um asqueroso sistema político-econômico que matou 100 milhões de pessoas. Influenciou grandes humanistas, mas também deu voz a psicopatas como Stalin, Mao Tsé-Tung e Pol Pot. Esteve presente na valorosa experiência do eurocomunismo, também nos horrores praticados pelo Khmer vermelho. No Brasil, fez intelectuais de peso como Carlos Nelson Coutinho, mas também Jones Manoel. Está em partidos como o PT, uma proposta humanitária da década de 80, porém deu justificativa para as bizarrices de um PCO. Enfim, o nome de Marx está na utopia humanista e também na bárbarie.  






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