Novo livro de Sodré quer fazer da escravidão parte integrante e aparentemente eterna de nossas vidas

 


Por Adelson Vidal Alves 

O 13 de Maio é a maior revolução social da história do Brasil. A Lei que encerrou quase quatro séculos de cativeiro remodulou a estrutura jurídica-política da vivência nacional. No entanto, é verdade, ela não foi capaz de incluir e reparar os ex-escravos por anos de opressão vividos. O tempo seguinte da pós-abolição foi de festa, mas também de uma nova convivência com a exclusão. 

O movimento negro costuma desdenhar da data como sendo pura farsa. Nada teríamos a comemorar. Muniz Sodré em seu novo livro "O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional" fala de uma "forma social escravista", basicamente tratando o racismo de nossos tempos como sendo um novo modelo de discriminação, substituindo a violência oficializada da escravidão por hierarquizações raciais fundadas na inferiorização do status do negro. A escravidão estende seu mal pela história deixando sua marca nas relações raciais que se apresentam depois da lei áurea. 

O livro de Sodré começa com uma verdadeira esculhambação da história americana. A independência das treze colônias teria sido criada em total desconsideração com o destino dos afrodescendentes. A legislação que segregou o negro americano testemunharia a construção de uma nação racista, segregadora e supremacista. Faltou pouco para o autor elogiar a famigerada tentativa de se repensar a fundação dos EUA, onde sai a luta dos colonos e a causa da liberdade e entra a escravidão como elemento fundador. É o tal Projeto 1619.

Muniz não acredita em racismo estrutural. Para ele não há "estrutura" determinando o preconceito, mas ele também não seria unicamente ação individual. No campo da coletividade estaria operando um imaginário histórico que fomenta o racismo, que funciona na esfera privada mas também na cultura geral. Seria uma espécie de mentalidade hegemônica no campo da superestrutura. Assim, entendo eu, o racismo pode ser vencido no espaço das ideias, bem diferente do que pensa o fatalismo ativista. 

Mas Sodré também encarna a narrativa identitária. Ele usa de exemplos isolados para demonstrar que instituições brasileiras como as universidades, a diplomacia e a polícia obedeceriam ao preconceito de cor. Até a imprensa se prestaria ao papel de sustentar situações e estereótipos raciais. Na verdade, é evidente que é tudo ao contrário. O mundo acadêmico e a mídia estão há tempos capturados pelo pós-modernismo identitário negrista. A Globo e a Folha de São Paulo estão de joelhos para o multiculturalismo identitarista.

Rui Barbosa, que nesse ano lembramos 200 anos de sua morte, é lembrado como quem queimou arquivos da escravidão para tentar anular um capítulo imoral da nossa história. Barbosa, abolicionista de carteirinha, só queria dificultar a vida dos senhores de escravos quando estes buscassem por indenizações pelo fim da escravidão. Houve tempo ainda para chamar Monteiro Lobato de militante da eugenia e colorir o mulato Machado de Assis de preto. 

Claro que o racismo brasileiro não são só ações isoladas de gente malvada e sem noção, ele tem raízes culturais em um capítulo vergonhoso de nossa história. Mas o que Sodré faz, acompanhado de outros como Jessé Souza, é centralizar nossa existência nacional em torno do escravismo. Por meios distintos a escravidão ainda estaria aqui como protagonista. Não seríamos um país que vivenciou e venceu o cativeiro, mas simplesmente uma nação fadada a conviver com seu passado e presente escravocratas.


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