Liberalismo e democracia são sinônimos?


Por Adelson Vidal Alves 

Quem deve ter o poder de decisão? Se sua resposta for "um soberano", é monarquia. Se disser "só alguns" então é oligarquia. Mas se você prefere que o poder fique nas mãos do povo, você defende a democracia. 

Benjamin Constant em seu famoso discurso "A liberdade dos antigos comparadas  a dos modernos" explica a antiga liberdade como sendo o exercício público e direto da escolha popular. Entre os modernos, prevalece a liberdade dos indivíduos para acumular. Nas democracias liberais, há um feliz casamento entre o sufrágio universal e os direitos individuais. Mas isso não significa que democracia e liberalismo sejam sinônimos. Se um regime político permite a eleição democrática de tiranos que atacam direitos dos indivíduos, tal democracia não é liberal. 

Nem todo liberal é democrata. Basta lembrar a grande obra de Alex de Tocquevile, "Da democracia na América". O autor compreendeu que a democracia pode promover uma "tirania da maioria". O já citado Constant entende que só proprietários devem participar das decisões nacionais, afinal, quem não paga aluguel não deve ir às reuniões de condomínio. Por fim, Imannuel Kant entendia que só quem tem independência de juízo pode votar. Mulheres dependem dos maridos, operários dos patrões, por isso, não podem decidir na esfera pública. Tocquevile, Constant e Kant eram liberais, mas não democratas. 

Mesmo um pensador sofisticado e a frente do seu tempo, como John Stuart Mill, problematizava a democracia. Mill foi um dos primeiros pensadores a defender o sufrágio feminino, mas defendia o chamado "voto plural", isto é, o voto teria valor distinto entre as pessoas, diferente do nosso ideal democrático de "uma cabeça, um voto".

As críticas operadas contra à democracia vem lá de Platão. Em comum, a desconfiança com a ideia de que a decisão da maioria é necessariamente boa. Ao contrário, a entrada das massas na esfera se poder é vista por muitos como a predominância do sentimento no lugar da racionalidade no processo de escolhas. Um democratismo puro, assim, é um perigo, pois pode implementar o domínio da maioria sobre o indivíduo. 

Se não são sinônimos, é normal entender que é na democracia que melhor funciona a defesa liberal das liberdades. Se o poder está esparramado em meio à totalidade, mais fácil impedir a supressão de direitos. Milton Friedman, grande economista liberal, assessorou a ditadura de Augusto Pinochet, na compreensão de que, tendo liberdade econômica, a liberdade política é consequência. Não é. As liberdades precisam ser pensadas de forma ampla, e combinadas com a participação popular de todos. Na Hungria de Victor Orbán há eleições, mas a imprensa e as ideias são controladas, é a chamada democracia iliberal, modelo autoritário que chega aos nossos tempos. 

As democracias liberais do Ocidente seguem tendo a melhor operação institucional. O encontro da democracia e do liberalismo produziu o que há de melhor em matéria de organização política. Motivo pela qual uma Agnes Heller, discípula do comunista Lukács, apelava para a necessidade de sua defesa incondicional.

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